terça-feira, 11 de julho de 2017

recolhia pedaços de gente,
alimentava o ego de manhã
para o matar de madrugada.
o seu tempo era redondo,
o relógio sem ponteiros
girava sempre em redor
dos astros e da sua sensibilidade
pronunciadamente fértil
inevitavelmente frágil.
o seu egocentrismo
atmosférico, volátil
e amava sempre de pulmões
abertos, cheios
irreversivelmente fracturados.

sábado, 20 de maio de 2017

a contemplação é para quem sabe declamar poemas calado.
o silêncio tem a amplitude de uma linha recta.

segunda-feira, 20 de março de 2017

a tua geografia estrutural
na ponta do meu carvão impotente.
descalça-te sobre mim,
verte aqui o teu peso sólido,
a tua metafísica líquida.
utopia que gira,
que mastiga
que rasga.
o corpo descansa
por baixo da roupa,
por cima dos pés.
atira-nos,
atira-me,
planamos.

sábado, 10 de dezembro de 2016

submergir aqui
do lado esquerdo.
sem pressas para te
chegar ou para te partir.
e virar do avesso todas
as (im)probabilidades.
negar toda a metafisica de
um dia sórdido.
que o dia, esse,
começa com o abrir dos olhos,
e o amor, esse,
começa com o abrir do coração.

(um dia saio para a rua e digo que te amo,
ainda bem que natureza não tem calendário.)

segunda-feira, 28 de novembro de 2016

não há nada mais bonito do que a língua portuguesa.

quando digo que a minha natureza se enternece,
quando digo que todas as flores do mundo são para ti,
quando digo versos de outrem porque os meus não são suficientes,
quando digo que todo o meu entendimento se agranda na tua presença,
quando digo até aquilo que não te digo,
não digo a verdade,
e tão pouco te minto.

sábado, 26 de novembro de 2016

agora sim, vejo tudo com uma nitidez repleta de náuseas.
a realidade escapa-se,
derrama-se pelo asfalto molhado da cidade.
há carros, há gente dentro dos carros,
há corações dentro da gente.
gente que é capaz de morrer várias vezes
no mesmo dia,
e eu sei que há muito mundo no
fundo de uma garrafa de vidro
e, mais ainda, no fundo de um corpo partido.
amanhece e todos os dias, na mesma cidade,
uma nova cidade e,
agora sim, vejo tudo com uma nitidez repleta de náuseas.

ossos virados
para fora.
ossos vidrados
para fora.

vê.

o teu nome sempre
impresso nas paredes
de todas estas cidades
[da Europa.
nunca tu terás outro nome,
o teu núcleo sempre quente,
melancólico até ao centro.
espinha dorsal de mil movimentos,
nunca os mesmos, porém
nunca distantes dos mesmos.
e descansar como se eu fosse
terra e tu árvore.

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

todas estas coisas bonitas
estão fora do sítio:
os olhos não ouvem,
a pele não cheira
o coração não respira.
de hoje em dia,
ou tudo é torto,
ou está tudo morto.

domingo, 6 de novembro de 2016

recolhia pedaços de gente,
alimentava o ego de manhã
para o matar de madrugada.

quinta-feira, 3 de novembro de 2016

veia cava superior

repara
aqui
deixaste
isto:
pedras
sapatos
três cigarros.
envolvimento
sublime
parecia
mais.
misturar
mais.
mais
tinta,
mais
mãos.
a esfera
ficou,
o resto
é pobre
e está
cheio de
buracos.
metade
fica
pelo
caminho
outra
metade
fica
pelo
coração
dessa
gente
longe
de ser
algo
que
não
gente.
nada
nunca
meu.
alicerces
de
azoto
liquido
equivalente a
zero.
desculpa
este
verde
longe
de ser
perfeito.
ouve
o poema
que
cai
bate
na veia
cava
superior,
na
minha,
quiçá,
na
tua.
a gravidade
afirma
a sua
presença
todos
os
dias.
estas
coisas
bonitas
ficam
do
avesso,
ossos
virados
para
fora.
ninguém
toca
ninguém.
dois
mil
orgasmos
(esses tantos).
crescer
em ti
em mim
crescemos
mãos
dadas
amor.

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

éme.

lust for life. not a single empty street.
yellow taxi. flowers forgotten in the back seat.
a map but lost still. alone but never lonely.
bikes and books.

terça-feira, 5 de julho de 2016

a memória cravada - impressa -
contra o tecto
do intelecto.
acordar sem quebrar o sonho,
prolongar o momento próspero antes do sonho se tornar
areia,
e os olhos se tornarem permeáveis
ao vento.

sábado, 11 de junho de 2016

linda (primavera) martini

fomos tão felizes
como queríamos ter sido.
nada foi suficiente
até ao primeiro
salto para a atmosfera.
cabelos pelo ar,
um vórtex de pessoas.
deixa tudo para trás,
nada do que fica lá atrás
importa.
os egos, os casacos,
os outros.

o tesão era demasiado alto:
"foder é perto de te amar
se eu não ficar perto."

terça-feira, 3 de maio de 2016

sábado, 30 de abril de 2016

ainda e sempre

pouco sabes do espaço que contruí para nós.
habitas e respiras no teu quotidiano pesado
e nunca são meus esses teus olhos abruptos de realidade,
o entendimento sempre foi suficiente,
e nós, meu amor, mais do que matéria escorregadia,
somos feitos de crescente volúpia.



terça-feira, 12 de abril de 2016

Luxemburgo, Suíça, Dinamarca

ser todas as coisas
prolongar um sentido
depois outro
e outro.
morder o mundo inteiro
sem sobrar nada
para depois.
qual maçã 
qual pecado
qual poesia.
vermelho
cinematográfico
espalhado nos teus lábios.
a minha sede é outra
e a água escorre-me
a pele 
e depois
o entendimento.
o tudo reduzido a átomos
excepto as sombras,
que essas pertencem ao 
nada.


domingo, 3 de abril de 2016

sábado, 12 de março de 2016

(...) mas és assim:
uma icógnita.
há quem diga que a icógnita pode ser nada:
não consigo acreditar.
o nada só é nada porque não tem lados.
tu tens
pelo menos
ou
pelo mais
o lado de fora.
o lado de dentro: (não) tenho provas.

domingo, 31 de janeiro de 2016

beber o
mundo.
provar o
sangue teu
jorrar
contigo
para a eternidade
do Sol.
do agora.
do abismo.
sou melancolia envolvida
nas árvores
despidas
ao luar.
coração a bombear
a paixão
do teu corpo.
voltar
do meu corpo
para em teu ombro
desenhar
por linhas tortas
a saudade.
                            [ah a saudade!
quero-te
toda essa liquidez
da água
que te
fez
com a sede
de
beijar.
é de esperar
carta sem
resposta.
ao poema atirar
o lixo.
cuspir.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

as coisas pequeninas



gosto de atribuir um valor grande às coisas pequeninas

porque toda a gente anda tão apressada no mundo que parece que só reparam nas coisas que estão à sua altura e que lhes surgem à frente. não olham nas outras direcções. (a tecnologia a 3D e as pessoas a 1D, mas isso são outros quinhentos.)
gosto de atribuir um valor grande às coisas pequeninas

porque toda a gente se esquece delas. assim elas podem ficar mais altas e pode ser que alguém as veja melhor.

gosto de atribuir um valor grande às coisas pequeninas

porque, no fundo, somos todos pequeninos só que achamos que temos tamanho suficiente para existir acima do resto do mundo.

acima das coisas pequeninas.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

eu mundo. eu universo.

tocar nos limites do crânio com a ponta dos dedos. as circunvoluções do encéfalo impressas contra o osso. qual obra de arte desconhecida do avesso. sentir a exponenciação do tacto virado para dentro. desenhar sem lápis nem papel. desenhar tal qual o melhor desenhador do mundo.
a arquitectura da mente, que toda ela não é mais do que ramos de árvores a crescer ao sol, bebendo a água do mesmo solo que outras árvores. o suporte. a origem
ascenção sem ter o abismo é paradoxal porque um só existe suportado pelo outro através da comparação do espaço.
medir o todo é aceitar que existe o nada. 
assim como o amor: uma tese existencial em permanente mutação.
a metamorfose.
a consciência sublima-se na palma da minha mão.
eu sou.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

de novo

a beleza nem sempre supérfula.
o super ego nem sempre pesado.
a escuridão permitiu que visses
com a ponta dos dedos o arrepiar da pele.
o pescoço nu,
depois o ombro.
a água.
perder um sentido pode ser o culminar de outro.
o mesmo com os corações:
uns mais.
outros menos.
e tu que foges
a oito pés
da fatalidade,
camuflas qualquer arritmia.
tu ali:
sem ondas, sem o tremer das pernas. sem ser humano.
nós em parte alguma,
mas
com todas as assimetrias
e dissonâncias
a que temos direito.
o carrossel parou
e eu:
saí.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

domingo, 13 de dezembro de 2015

tenho primasia pelas sensações fortes. arrebatadoras.
as que deixam o coração às voltas
e a cabeça em modo instinto.
dar mãos ao corpo.
dar corpo às mãos
que de raciocínio está o mundo cheio
(d)ela.
um orgasmo vazio perdido
o quarto onde nunca vamos regressar.
madrugadas a transpirar o teu perfume
o silêncio é para os que sabem imaginar.
as mãos na boca.
o peso de ti todos os dias.

todos
os
dias

sábado, 5 de dezembro de 2015

"Uma das minhas preocupações constantes é o compreender como é que outra gente existe, como é que há almas que não sejam a minha, consciências estranhas à minha consciência que, por ser consciência, me parece ser a única.
Ninguém, suponho, admite verdadeiramente a existência real de outra pessoa.
Os outros não são para nós mais que paisagem."
Bernardo Soares

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

tu sempre nuvem

existes. deixas de existir.
há um buraco com ruído de fundo.
a terra. o mundo.
água por ti a baixo.
a nudez ergue-se nos
incrementos infinitos dos meus dedos.
a lucidez. o deleite da luz branda sobre o verde.
verde espaço. verde musgo. verde árvore.
árvore é feminino.
sol nem sempre é sol.
casa nem sempre é casa.
ocupada.
exposição exagerada.
simetrias. focos. raízes quadradas.
limites sorvem-se de caos.
três e dois seis.
talvez se fossemos não eramos.
o eco prolonga-se no ar e denuncia-te.
tu escondida num canto qualquer.
pernas e pernas passam.
sentam-se. falam. beijam.
adeus, até à proxima.

slides (retratos da cidade branca)

"onde estão os meus amigos?
remotas memórias saltitam. pululam.
cheiros. odores. miragens.
o café. o sorriso.
olá, como está?
e outras encenações
a novidade
a vizinha do 3º fugiu, amanhã vem no jornal
ai, a imperial da munique
os destemidos tremoços
moços. maçons.
canalha. navalha.
[pensa coração]
amigos, onde estais?
a sueca com minis à mistura
o relato da bola
a malha. copo de três
a feira do relógio
o relógio da feira
sandes de couratos. vinhos de torres
jogging de marvila
domingo
especialmente domingo
barbeados. dentes lavados
e martinis no plástico labrego
alumínio. moderno. kitch. mau gosto
doze cordas. mãozinhas
salteadores da razão perdida
perdidos. enjaulados
correio da manhã
o cú da vizinha do nono bê
regalo para a vista
suplemento a cores com salários em atraso
e a lisnave. petroquímica
cancros do meu tejo
apodrecendo lentamente o azul das águas
e eu. impotente. cinemascope. trinta e cinco milimetros de mim
a raiva afogada entre cubaslibres e pernas de mulheres
que não são putas. nem são falsas. nem são nada
são pernas de mulheres e cubaslibres simplesmente
paga-se a saudade com cartão de crédito.
táxi, leva-me para onde está o meu amor.
táxi, leva-me para lá de mim.
táxi, atropela-me os sentidos e a alma para não deixar vestígios."

Viriato Ventura

terça-feira, 3 de novembro de 2015

o espaço.
estar mais distante de uma coisa implica estar mais perto de uma outra coisa.
e vice-versa.

sábado, 24 de outubro de 2015

verões ou invernos estes
do desperdício dela
desse todo que é nenhum.
há o tempo e depois a fome.
subversões da tua pele apenas aqui
neste canto, olha.
existes num cubo sem arestas.
um milimetro de mente. de ego, talvez.
meio passo em frente. os dois pés levantados do chão.
ambos.
podes.
já te disse que podes.

sábado, 17 de outubro de 2015

hoje é(s) demasiado presente
e as tuas mãos.
e as tuas mãos.
e as tuas mãos.
e as tuas mãos.

domingo, 6 de setembro de 2015

gostava que fosses
tu
és isto: não tens definição.

o amor é uma moeda com duas faces na palma da mão.
neste plano a moeda não existe.
quando não há o voar demasiado alto também não há o medo de cair.
quando não há o medo de cair
não se cai.

vê-se o rosto desfocado de uma rapariga morena de lábios salientes. começa-se a focar e percebemos que está num café. há o ruido de talheres e conversas soltas no ar. alguém pede um café e um quarto de águas. a televisão está ligada num canal qualquer. o vai e vem habitual.
ela tem um cigarro entre os dedos pequeninos e ouve-se um suspiro quente que atropela o fumo do cigarro que se desenrrola no ar.
a densidade. tem as unhas roidas. o pé direito marcapasso. ouve-se um relógio que se sobrepõe ao resto dos sons. em eco. um som opaco.
passa a língua nos lábios. engole.
ouve-se a sua saliva, como se estivessemos na boca dela:
a tensão.
vinil sobre parede, espelho
lista telefónica, impressão digital
rodas giratórias, cubo de
vidro, néon e objectos variados
o ego